Precipitação cai para metade em 80 anos

Com a chegada da primavera, o nosso país tem vindo a cobrir-se de um manto verde, mas a zona sul do nosso país, nomeadamente no Baixo Alentejo, não fica indiferente à seca, uma realidade muito presente.

Ainda com os períodos intensos de chuva que se deram no final do ano, Beja registou níveis de seca fraca e moderada, de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

Recentemente, os dados divulgados pelo projeto que visa recuperar a produtividade agrícola e florestal na zona, REA Alentejo, afirmam que, nesta região, em 80 anos, o valor médio de precipitação na região caiu para metade. Para agravar este quadro, o clima e as más práticas agrícolas fizeram com que 94% do Baixo Alentejo se tornasse suscetível à desertificação. A região de Mértola chega mesmo a registar 96% de suscetibilidade a este fenómeno.

A informação foi divulgada na passada sexta-feira, dia 17 de março, pelo REA Alentejo, iniciativa promovida pela Associação de Defesa do Património de Mértola (ADPM). Este refere que as NUTS do Baixo Alentejo apresenta 38% do seu território com suscetibilidade crítica à desertificação, 35% muito elevada e 21% elevada. Apenas 5% conta com níveis moderados e 1% com níveis reduzidos.

Coordenadora do REA Alentejo, María Bastidas, ressalta o elevado grau de degradação ao qual temos vindo a assistir, como consequência da desertificação, que se confirma com os dados recolhidos pela Estação Meteorológica de Vale Formoso, e partilhados pela REA Alentejo: entre 1940 e 2022 assistiu-se a uma diminuição acentuada na média de precipitação anual, por décadas. Enquanto que na década de 40, o valor médio anual de precipitação era de quase 800mm, na década de 2010 o valor diminuiu para 474,2 mm. De 1940 a 1970, a média anual de precipitação foi de 601 mm, enquanto nos últimos 30 anos (de 1991 a 2021) o valor desce para os 446 mm.

Segundo a investigadora da NOVA FCSH, Maria José Roxo, “a aridez tem aumentado” naquela região, como resultado da diminuição da precipitação e aumento das temperaturas – “o que contribui para uma alteração na estrutura dos solos e nas quantidade e qualidade dos recursos hídricos”. A agricultura intensiva também contribuiu para o agravamento do fenómeno, “uma vez que esta prática não tem em vista a proteção do mesmo e este vai perdendo qualidade”, acrescenta.

Além destes, existe ainda uma responsabilidade a ser atribuída à questão climática, alerta a investigadora da NOVA FCSH. O último ano, em particular de setembro de 2021 a agosto de 2022, fez-se sentir a seca mais severa de que há registos – apresentando o valor total anual de precipitação na ordem dos 298mm. No entanto, apenas no curto período de inverno, de dezembro de 2022 a fevereiro de 2023, choveram mais 200mm.

Como tal, torna-se evidente que a “enorme irregularidade na precipitação e na distribuição pelas estações do ano, contribui para uma grande incerteza em termos agrícolas e para o desencadear de episódios de erosão que favorecem a degradação dos solos, quando ocorrem chuvas intensas ”, remata Maria José Roxo.